A revolução digital trouxe, nos últimos anos, conquistas para a
humanidade em todas as áreas do desenvolvimento. Na área social, não foi
diferente. Cálculos estatísticos de grande complexidade que levariam meses para
ser realizados, hoje, podem ser rapidamente executados com o aperto de apenas
um botão. Esses cálculos contribuem para a definição de associações existentes
entre problemas sociais (como uso de drogas, práticas de violência, não uso de
preservativo, hábito do fumo, etc.) e determinantes econômicas, sociais e/ou
comportamentais (como a pobreza, normas culturais e dificuldades de
relacionamentos).
Antes da revolução tecnológica, as pesquisas sociais focavam análises
exploratórias dos dados. Ou seja, a definição de perfis de comportamento e dos
próprios problemas sociais. Por exemplo, se constatamos que 14% de uma
população de jovens já experimentou o uso de drogas ilícitas em algum momento
de sua vida, qual a contribuição desse indicador para uma nova intervenção
social? Logicamente, esse indicador apresenta um perfil de comportamento. Isso
é importante para entendermos a magnitude do problema, mas não apresenta quais
as determinantes que influenciariam para uma variação significativa desse
número para mais ou menos. Será que jovens que conversam mais com seus pais
e/ou são do sexo feminino são menos vulneráveis a esse consumo?
Essas são hipóteses importantes que precisam ser testadas para que um
problema social seja atacado corretamente. Isso reduz os custos de novas
intervenções sociais, dando mais foco e adaptando a linguagem. Se mesmo no caso
de vacinas, toda a população não precisa ser vacinada para um país atingir um
nível de 100% de cobertura, em função do conceito de “proteção herdada”, não é
de surpreender que outras questões sociais precisariam apenas focar em menos de
10% de uma população.
No entanto, onde estão essas vulnerabilidades? Como identificá-las? Será
que há apenas uma determinante fundamental para que um problema social se estabeleça? Por
exemplo, será que todo o problema de violência urbana pode ser atribuído a
falta de educação da população, como ouvimos rotineiramente nas vozes de
políticos e leigos?
A ciência social evoluiu bastante nos últimos anos para responder a essas
importantes perguntas. Na grande maioria dos casos, não há como se estabelecer
uma causa única para os problemas sociais. As pesquisas “causais” são
geralmente realizadas em laboratórios e estão diretamente ligadas a disfunções
físicas e mentais que causam determinadas doenças e/ou mortes. Ou seja, a
pesquisa “causal” é a busca pelo estabelecimento de um fator que explica 100%
de um fenômeno social.
Sendo assim, mesmo levando em consideração que não podemos estabelecer
uma única causa para um problema social, um novo campo se abre de investigação
com a possibilidade do desenvolvimento de pesquisas de cunho explanatório. Ou
seja, pesquisas que consigam atribuir objetivamente a associação entre
determinantes sociais, econômicas e comportamentais e os problemas objeto de
investigação. Nesse caso, há de se vestir as “sandálias da humildade” e
compreender que sempre haverá fatores que vão além de um modelo estatístico
estabelecido.
Na literatura internacional, alguns modelos considerados robustos e de
grande significância estatística apenas conseguem estabelecer níveis
explicativos de variação de um problema social até no máximo 10%. Logicamente,
o ideal é sempre tentar incorporar variáveis que aumentem esse valor, mas já devemos
considerar que um nível de explicação de 100% é simplesmente uma utopia.
Para exemplificar com um caso recente de como se deve ter cuidado para
não confundir análises de cunho exploratório e análise de cunho explanatório,
um estudo recente realizado pela Durex Network sobre a sexualidade do
brasileiro foi bastante esclarecedor. Em um primeiro momento, foi perguntado
aos brasileiros quais seriam suas principais fontes de educação sexual. Como
demonstrado na pesquisa mundial da Durex Network sobre sexualidade, no ranking de principais fontes, amigos/colegas
“venceram” facilmente as outras fontes de educação com mais de 75% das
indicações. Foi interessante observar também que os pais e responsáveis ficaram
em 7º. Lugar com apenas 33% das referências.
Em base a esse
resultado de cunho exploratório, o que fazer? Logicamente, muitos especialistas
em marketing social
diriam que o foco de novas atividades educativas deveriam ser com os próprios
amigos e colegas, enfatizando talvez iniciativas como a de “multiplicadores do
conhecimento”.
No entanto, a pesquisa
da Durex Network (
www.durexnetwork.org)
foi além! Em base a uma análise explanatória, buscou-se identificar quais
dessas fontes teria realmente impacto sobre o nível de confiança dos brasileiros
em relação a sua sexualidade. Pois, não se pode afirmar que por alguém ser mais
exposto a uma fonte de educação, tornar-se-á mais confiante. Talvez essa fonte
não seja a mais eficaz..
Para surpresa dos
pesquisadores, apenas uma fonte se mostrou significativamente mais eficaz do
que todas as outras em relação a maior confiança sobre a sexualidade dos
brasileiros: os pais ou responsáveis. Ou seja, com os amigos/colegas
realmente se conversa muito sobre sexo, mas não há qualquer impacto objetivo
sobre níveis de confiança. Do outro lado, com pais e responsáveis não se
conversa muito, é fato, mas essa fonte é a principal determinante para explicar
níveis de variação positiva na sexualidade do brasileiro.
Nem tudo é aquilo que se vê. Um profissional de
marketing social deve
sempre ter um perfil investigativo e validar os indicadores de pesquisa com
senso crítico. Pois, o objetivo é sempre impactar positivamente a vida das
pessoas e da comunidade. Ou seja, da próxima vez que tomar conhecimento sobre o
lançamento de uma nova pesquisa, nunca aceite seu resultado sem se perguntar...
Quais são as variáveis que realmente têm impacto para a melhoria da qualidade
de vida da sociedade?